No Maranhão, eleição para o governo do estado tem ‘agenda do século 19’
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SÃO LUÍS — Por volta de 11h de domingo, 29 de julho, o ex-senador José Sarney desceu da van acompanhado dos filhos Zequinha e Roseana Sarney. Ela disputa outra vez o governo do Maranhão e ele quer uma das vagas ao Senado. Junto ao trio, ainda estava o senador Edison Lobão, aliado histórico no MDB e na disputa. Protegido por seguranças contra empurrões de partidários, Sarney caminhou frágil até o palco da convenção. Roseana não queria disputar o governo, mas o pai a pressionou. No palco, onde a cantora Alcione entoara um jingle, Roseana convenceu o ex-presidente a falar.
— Eu encontro o Maranhão triste, porque voltaram a violência e a perseguição — afirmou. — Com Roseana, essa tristeza vai acabar.
No dia anterior, um sábado, o governador Flávio Dino (PCdoB) fez a convenção num espaço maior. O governador montou uma coligação com 16 partidos, espécie de centrão maranhense. Ao final do evento, a turma de Dino mostrou que repete práticas atrasadas. Pela presença, os cabos eleitorais receberam uma quentinha com Coca-Cola.
Sob o argumento de que a família Sarney levou o Maranhão ao atraso, a vitrine do governo Dino no Maranhão é, como ele mesmo define, “um projeto do século 19” que os antecessores, por décadas no poder, sequer conseguiram alcançar. O estado constrói escolas de alvenaria, com energia, banheiro e água encanada no lugar das feitas com paredes de barro (chamadas de taipa) na zona rural de cidades do interior, onde muitas crianças nunca viram vaso sanitário na vida. Cada unidade custa cerca de R$ 500 mil. A Secretaria Estadual de Educação diz que já ergueu 71 e mais 130 vão sair do papel. É pouco. Em 2015, o governo identificou 1.090 escolas de taipa, outras de palha.
— Podem dizer: “se eles estão começando a trocar taipa por alvenaria agora, até chegar à robótica vão demorar cem anos”, mas temos projetos mais otimistas, com escolas em tempo integral equipadas com laboratórios — afirma Dino.
Ele disputa a reeleição contra a ex-governadora Roseana Sarney (MDB), que comandou o estado de 1995 a 2002 e de 2009 (com a cassação de seu adversário Jackson Lago) a 2014.
Dino aposta as fichas no projeto de educação, num estado onde 48% das pessoas recebem o Bolsa Família, maior percentual do programa no Brasil, que paga em média R$ 187,79 ao beneficiário. Hoje, a gestão Dino desembolsa R$ 51 por criança do Bolsa Família para compra de material escolar. Espera melhorar o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) que, por enquanto, só subiu no ensino médio de 2,8, em 2013 (no governo Roseana), para 3,1, em 2015.
MISÉRIA AVANÇA
Nas últimas semanas, com o fervor da campanha eleitoral, a discussão sobre PIB e número de miseráveis do Maranhão ganhou espaço nas rádios locais, nos blogs da internet e nas conversas sobre política. A discussão é se Dino melhorou ou piorou o legado da família Sarney. No último ano da gestão Roseana, em 2014, dados do IBGE diziam que o estado tinha o maior percentual de miseráveis do país (12,9%), à frente do Piauí a partir de 2012.
— Não acho o estado miserável. Eu deixei o PIB na 16ª colocação. Hoje está na 17ª — reage Roseana.
Os índices atuais são pouco animadores. Levantamento da LCA Consultores, publicado pelo “Valor Econômico” em abril, enquadra 1,33 milhão de pessoas na faixa da pobreza extrema em 2017, gente com renda per capita de US$ 1,90 por dia. Isso dá 19% da população maranhense. A miséria avançou mais na capital, São Luís, onde houve alta de 48%. Dino culpa a crise econômica que atingiu o país. Ele comemora o PIB de quase 10% em 2017, calculado pelo banco Itaú. Roseana cita a queda de 11,5% registrada em 2015 e 2016 pela consultoria Tendência.
Em um ponto Dino e Roseana concordam: Lula precisa ser libertado. Além da convicção jurídica, ambos buscam pegar carona na popularidade do ex-presidente no Nordeste.
O Maranhão tem 980 mil analfabetos, 14% da população. Sem se preocupar com as críticas “ao político comunista”, Dino adotou um projeto cubano de alfabetização para jovens e adultos. Entregou a missão de ensinar a ler e escrever, no tempo recorde de oito meses, ao Movimento dos Sem-Terra. O MST ficou encarregado de montar salas de aulas em vilarejos, recrutar alunos e, pelo método de Cuba, insistir que concluam o curso.
Segundo o governo, o programa já formou 28,8 mil pessoas ao custo de R$ 25 milhões. O secretário Felipe Camarão disse que o estado não podia “contratar juridicamente” o MST, um movimento sem personalidade jurídica, então repassou o dinheiro a duas fundações ligadas a universidades. No passado, entidades vinculadas ao movimento foram acusadas de desviar dinheiro na administração Lula.
— Aqui há zero problema. Não teríamos o resultado em alfabetização sem a parceira com MST. Eles têm a metodologia e nos ajudam no recrutamento e treinamento dos educadores — afirma o governador.
O projeto do MST custa mais caro que o similar do governo federal. O coordenador e alfabetizador ganham juntos R$ 1,9 mil, enquanto o Brasil Alfabetizado paga R$ 1 mil. Coordenadora pedagógica, Simone Silva Pereira afirma que o MST não movimenta dinheiro e nem contrata professores, apenas indica o material a ser comprado para as salas de aula.
SEM SARNEY NAS ESCOLAS
Fora da área de educação, o governo contratou 3,5 mil policiais, o que elevou o efetivo para 15 mil agentes, um aumento de 25%. As estatísticas oficiais dizem que a taxa de crimes letais caiu de 30,6 por 100 mil habitantes, em 2014, para 27,8, em 2017. A redução teria poupado 153 vidas. O Fórum de Segurança Pública tem um indicador menos favorável. A taxa de mortes violentas saltou de 31, em 2014, para 34, em 2016, dado mais recente da ONG.
Uma coisa mudou de fato no Maranhão. Flávio Dino mandou tirar os nomes de José Sarney, Roseana e outros integrantes da família de ao menos cem escolas estaduais. Ele se valeu da lei que proíbe esse tipo de homenagem a pessoas vivas. Sarney se irritou.
— Minhas fontes disseram que Sarney considerou a retirada dos nomes uma ofensa pessoal. Disse que (Josef) Stalin também tirou o nome de (Leon) Trótsky na Rússia — diz Dino, rindo. (O Globo)
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