O PREÇO
Como se eu fosse falso,
eles me perguntam:
“qual o teu preço?”
e jamais compreenderão que morrerei
fiel a mim mesmo, quando respondo sorrindo,
para não ofendê-los com as lâminas
de minha revolta: “quero um lugar sossegado,
onde o mundo me esqueça”.
E eles respondem:
– Mas todos os cantos da Terra
foram comprados: 1/3 pelas multinacionais,
outra parte pelos abutres famigerados,
e o restante pelos vampiros governamentais.
E novamente perguntam:
“então, não queres ser leiloado?”
E eu me calo, porque estou com um
relógio no braço,
os cabelos cheirando a xampu,
um terço de um contrato
e alguns trocados para não ficar nu.
Eles propõem, então, aproveitando minha fraqueza,
minha filosofia barata, desvalorizada, em liquidação:
“te damos nossas mulheres,
nossos leitos e nossos talheres,
apenas pelo teu contrato e pelos teus feitos”.
E eu, fingindo ser subordinado, por enquanto, aceito.
OURO NEGRO
Cultivando minha ilha,
o olhar absorto e condoído nas palafitas,
crianças barrigudas, irradiando o medo,
cheiro de peixe morto nas almas aflitas;
concluí que essa miséria
vem de nossa dívida, em Brasília,
por tua causa, maldito sangue do século,
cobiçado ouro negro.
Por tua máxima culpa
as duas potências
lutam pela posse dos desertos,
onde tu escondes o estopim
da nossa imbecilidade última:
famintos por um Afeganistão,
tornaremos toda a Humanidade vítima,
destruiremos tudo que foi construído
em 100 séculos de civilização.
E os homens, negra vergonha nossa,
que já foram à lua,
voltarão à idade da pedra,
adorarão uma caixa-de-fósforo,
por máxima, máxima culpa tua!